quinta-feira, 26 de dezembro de 2013

esquartejaste todos os pequenos detalhes que eram meus.

por todas as tuas palavras. pelas permanências constantes sob uma ausência que nos é unânime. e por todas as vezes que perdoei falhas em ti. destroços de ti. duplas faces. desilusões sob ilusões construídas. por todos os momentos concedidos em que manifestei o incondicional valor do perdão. tudo sob rasgos de uma pele que nunca conseguiste despir. sob as fendas de uma convivência que ambos sabíamos ser finita. conhecíamos essa noção. por cada parte tua que eu conservo em sobressalto. construímos tudo sob papel. laminado. apodrecido. desprovido momento em nós. esquartejaste todos os pequenos detalhes que eram meus. colocaste tudo em termos que eram impróprios, esqueceste de amar tudo o que eu havia amado em ti. tudo o que nunca quis amar em ti, que amei genuinamente de ti. por ti. para ti. sufoquei-me em cada golpe teu. sempre em seco. encerrei em ti aquilo que dei a conhecer, como que se quisesse manifestar-me em cada gesto que era teu. eu digeri fraquezas que presumi serem forças. alimentava-me sem reagir à sensação de perda que deixavas a meu lado quando acordavas de manhã. tudo o que cedia era-me depois retirado, ou simplesmente não-retribuído. hoje penso que te quero perto. por ter saudades da tua presença, não por acreditar que me poderei alimentar novamente. não acredito em ti. preparei-me dia após dia para o dia em que vou sangrar novamente no chão da casa que nunca construímos. no valor de tudo o que não temos. na paz que não acreditámos e em todas as impossibilidades de um futuro.

terça-feira, 17 de dezembro de 2013

escondeste em meios termos.

agora não me apetece falhar. não me apetece falhar num momento em que eu acredito. não me permito recuar numa perspectiva da qual eu conheço todos os "se's" e interrogações. não pretendo comandar uma falha que é tua, por não ter mantido o que em mim é habitual. em mim existe a vontade de querer um início, de propagar um meio e não sentir um fim. em ti existe um mundo que eu controlo só às vezes, onde frequentemente me perco e onde em ti não sei estar. não aprendi a estar. estremeci enquanto lá estive. fugi a meio percurso sem conhecer no final todas as coisas que são boas e só a ti te pertencem. que são o que tu és. que escondes-te em meios termos e não desvendaste por opção.

quarta-feira, 11 de dezembro de 2013

pertence ao-teu-lugar.

faz parte perderes o rumo em ti. às vezes faz parte. às vezes faz parte perderes-te no mesmo lugar onde havias encontrado o que pensaste ser um futuro. e faz parte voltar a procurar um presente num lugar desconhecido. faz parte modificar tudo à tua volta. o que sentes. o que pensas que sentes. o que queres sentir ou o que te imaginas a fazer. faz sentido que nada seja como imaginaste, para que seja verdadeiro. inato. e Teu. sempre Teu no final. somos sempre nós que construímos a ocasião. a favor da sorte que nos é concedida. a favor de alguém que o acaso nos quis oferecer. e às vezes faz parte não saberes bem onde esse Alguém pertence, mas saberes que pertence ao-teu-lugar. por mais que não o conheças. mesmo não sabendo ainda, pertence algures a um lugar que por consequência também é teu.

domingo, 8 de dezembro de 2013

linhasescritasporquemsabeoquediz.

que não Arrefeça em Nós. que não arrefeça em nós nem a luz nem o fogo, que a fome entardecida pela penumbra da fadiga dos olhos nunca renuncie ao sabor dos frutos ou à febre da sede dos lábios. 

assim se faça tudo, amor, à medida do que se ama, que o corpo prostrado pelo êxtase não conhece tréguas nem assombro. 

desenha-me na paz dos azulejos com o meu perfil de ave anoitecida e inaugura no meu peito a festa circular dos dedos, tatuando ilhas em redor do coração. 

esquiva, demoras-te no verso o instante de lume de uma revelação 

e quando voltas é sempre com uma promessa de partida. quando partes é sempre com um anúncio de caos, de temor na clara água do olhar. deixo-te agora amar, indefesa, para resgate da alma.


 .José Jorge Letria.

quinta-feira, 5 de dezembro de 2013

sophiademellobreynerandresen

'É-lhes longínquo o sol quando os consome. É-lhes longínqua a noite e a sua fome. É-lhes longínquo o próprio corpo e o traço, que deixam pela areia passo a passo.

Porque o calor do sol não os consome. Porque o frio da noite não os gela e nem sequer lhes dói a própria fome. É-lhes estranho até o próprio rasto. 

Nenhum jardim, nenhum olhar os prende. Intactos nas paisagens onde chegam só encontram o longe que se afasta. O apelo do silêncio que os arrasta, as aves estrangeiras que os trespassam e o seu corpo é só um nó frio. Em busca de mais mar e mais vazio.'


sophiademellobreynerandresen.

segunda-feira, 2 de dezembro de 2013

veias inchadas de suores frios.

não estava certo. e tudo o que eu gostaria era que estivesse certo, alinhados e certos. nunca esteve. não esperes nunca que esteja certo. sempre achei que mais dia menos dia fosses uma sombra para mim inalcancável, com a qual não saberia conviver. hoje tenho-te lado-a-lado sob um plano esquecido que não suporto ver exposto e ao descoberto em qualquer lugar. não consigo que seja o plano certo. Nunca. evaporas-te do local por mim escolhido. atravessas-me o espaço próprio num consumo de horas a fio. fico sempre sem pinga de sangue. veias inchadas de suores frios que corpos quentes conseguiram levar. sei agora desta anemia, identifico-a em cada passo teu. conheço o vazio das forças. anseio o êxtase de uma reposição por ti. perdi toda a indiscrição. não me importa que não saibas o que me chamar, o que pensas chamar e o que vais chamar um dia. vou sair perdedor. saio quase sempre perdedor, mas recupero. Alcanço. Faço ferida. Curo. Mas eu recupero. quem sabe o que aconteceria se um dia fosses tu o alvo. quem sabe se esse lugar nunca te pertence porque na antecipação eu o ocupo por ti. sempre por ti. 
Quase sempre é o tempo. é o tempo em que te deixo pensar que sou eu quem sai sempre a perder.