sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

medo do depois.

As minhas mãos estão engelhadas como se um banho quente as envelhecesse. Me envelhecesse à luz de um mergulho por entre águas que não foram minhas. Que não serão minhas. Que apenas pareceram ser minhas, em dias que precisavam de pertencer a alguém. Nunca significou uma pertença. Fizeram sempre parte de momentos ausentes e soltos. Desenlaçados em palavras difusas, amargas, volúveis... No meu entender da questão, eu encontro-me aliado a mim mesmo, disposto a reviver o passado, na procura intensiva de um ser próximo de mim. De um jogo de espelhos invencível e incompreendido por todos. Mas partidário daquilo que eu fui, que eu sou, que sempre serei. Tenho medo do depois. Receio o que virá amanhã porque a minha reacção ao futuro se tornou cada vez mais inconstante. Ora me sinto suficientemente forte para me adaptar ... ora me vejo como um ser desarmado e incapaz de lutar contra a mudança, mudança essa decorrente do que me trazes à vida. De qualquer modo, e sem temer uma quebra daquilo que represento em mim, vou querer-te aqui, vou aceitar que sejas um duo. Vou distribuir a minha atenção. Agarrar-te pelo inesperado.

sexta-feira, 23 de novembro de 2012

O'Neill.

"A meu favor. Tenho o verde secreto dos teus olhos. Algumas palavras de ódio algumas palavras de amor. O tapete que vai partir para o infinito. Esta noite ou uma noite qualquer. A meu favor. As paredes que insultam devagar. Certo refúgio acima do murmúrio. Que da vida corrente teime em vir. O barco escondido pela folhagem. O jardim onde a aventura recomeça."

quarta-feira, 21 de novembro de 2012

Pólos opostos.

Não sei até que ponto te desejo por aqui. Não sei até quanto poderia, eventualmente, gostar que estivesses por aqui. Não é o medo de voltar à sensação que tinha quando cá estavas ... é o receio que essa sensação não fosse imaginativa e que fosse uma representação da nossa realidade. Eu vou sair vencedor de qualquer das formas, prometo-me. Eu vou proteger o que é meu, porque isso ninguém o fará por mim. Se porventura, os teus olhos me disserem que afinal a tua complexidade é a favor da minha ... vou sair vencedor porque voltaste a ser pequenas partes de ti quando estás por perto. Porque voltaste a um Ser que normalmente não costumas Ser, porque voltaste a encostar em mim todos os pedidos de alerta de um coração que precisa de controlo, e por isso abraçar-te-ei como forma de me fazer sentir protector de alguém que um dia me fez mal, mas que como todos merece protecção. Se por outro lado, eu vir em ti perdas sucessivas, verdades esquecidas e presenças ausentes em momentos indeterminados ... então sairei vencedor porque não perderei nada mais. Porque se continuasse perderia dignidade e amor próprio. Porque se ficasse ganharia apenas a ilusão de mais um dia. Porque se permanecesse no mesmo sitio que tu, mesmo que a distância não fosse significativa, estaríamos constantemente em pólos opostos.

sexta-feira, 16 de novembro de 2012

Horto de Incêndio.

"deus tem que ser substituído rapidamente por poemas, sílabas sibilantes, lâmpadas acesas, corpos palpáveis, vivos e limpos. a dor de todas as ruas vazias. sinto-me capaz de caminhar na língua aguçada deste silêncio. e na sua simplicidade, na sua clareza, no seu abismo. sinto-me capaz de acabar com esse vácuo, e de acabar comigo mesmo. a dor de todas as ruas vazias. mas gosto da noite e do riso de cinzas. gosto do deserto, e do acaso da vida. gosto dos enganos, da sorte e dos encontros inesperados. pernoito quase sempre no lado sagrado do meu cora- ção, ou onde o medo tem a precaridade doutro corpo. a dor de todas as ruas vazias. pois bem, mário - o paraíso sabe-se que chega a lisboa na fragata do alfeite. basta pôr uma lua nervosa no cimo do mastro, e mandar arrear o velame. é isto que é preciso dizer: daqui ninguém sai sem cadastro. a dor de todas as ruas vazias. sujo os olhos com sangue. chove torrencialmente. o filme acabou. não nos conheceremos nunca. a dor de todas as ruas vazias. os poemas adormeceram no desassossego da idade. fulguram na perturbação de um tempo cada dia mais curto. e, por vezes, ouço-os no transe da noite. assolam-me as imagens, rasgam-me as metáforas insidiosas, porcas. ..e nada escrevo. o regresso à escrita terminou. a vida toda fodida - e a alma esburacada por uma agonia tamanho deste mar. a dor de todas as ruas vazias." - Al-Berto.

IX

"Pusemos tanto azul nessa distância ancorada em incerta claridade e ficamos nas paredes do vento a escorrer para tudo o que ele invade. Pusemos tantas flores nas horas breves que secam folhas nas árvores dos dedos. E ficámos cingidos nas estátuas a morder-nos na carne dum segredo." Natália Correia, in "Poemas (1955)

segunda-feira, 12 de novembro de 2012

al berto / lunário

"(...) Um dia, quando a minha memória de homem fugitivo alcançar a idade de um deserto, debruçar-me-ei num poço e tentarei beber o tempo esquecido do teu rosto. Estarei lucidamente morto, eu sei, e os meus olhos já não prenderão a adolescência, nem as imagens que dela se soltaram. E a minha cegueira surgirá cercada por frondosas árvores e pássaros, mas não os verei mais. O rosto, o teu rosto, já não conseguirá atrair-me para o fundo circular do poço. O tempo de sedução terminou. Terás de me tocar, terás de trocar o tacto dos olhos pelo tacto dos dedos. Apenas persistirá o jogo, a cumplicidade, e uma ténue vibração do corpo que se perdeu contra o meu corpo. Por isso me ergo daqui e atravesso estas imagens coladas às paredes, e ao atravessá-las descubro que estou perdido, e condenado também a perder-te. Levanto-me do fundo de mim mesmo e abandono a casa, os bens que herdei, e vou pela memória daqueles vestígios que se me cravaram no interior das pálpebras, mas não semeio nem recolho nada. Apenas persigo os passos que outrora abandonei pelas cidades onde te procurei, antes mesmo de saber que existias. E perco-me, perco-me onde a sombra dos corpos é um sudário de melancolia sobre o mar. Mas, ainda aqui estou, quase vivo, atento ao movimento perene de tuas mãos sobre o meu corpo. E sem bússola, nómada até aos ossos, sigo pela noite onde aportei, e não reconheço a casa que me destinaram para morrer. (...) As cidades seduziram-me com imagens de abismos subterrâneos, vertigens de esperma que se vende, compra e troca. E sonhar com essas cidades de medo e fascínio é ainda uma maneira de saciar parte do desejo que me assola. Mas já só existo no que de mim se cristalizou nas palavras, e é tão pouco... De imobilidade em imobilidade a vida avançou, avançou por ininteligíveis iluminações. Hoje, neste fim de século, desloco-me sem saber como dentro das fotografias que revestem as paredes deste quarto. E é-me indiferente estar aqui. Sempre que posso fujo, fujo no olhar que cegou o meu. Porque eu fujo e vou com tudo aquilo que me chama e toca. Vou com o azul dos olhos do marçano ali da esquina, vou com as folhas das árvores no outono da minha rua, vou com a noite à procura da manhã sobre o rio. Vou pelos arranha-céus acima e contemplo dos altos terraços o sono esbranquiçado dos mortos. Vou com o teu corpo que me desgasta a memória doutros corpos e me transforma em esquecimento... vou, vou sempre, pela humidade dos cardos presos em tua boca. Abro depois as mãos, e não há mar nas suas linhas, nem barcos que venham descansar na ponta dos dedos, e a linha do coração - repara - é uma calosidade. E por uma noite da imensa cegueira, quando já morar definitivamente em ti, abandonar-te-ei... à hora dos répteis recolherem o calor nas fissuras do tempo. Intacto, irei à procura do merecido repouso." - al berto, lunário 1999

sábado, 10 de novembro de 2012

Vibrações.

Pequenas coisas tornam-se essenciais se as virmos como gigantescas entre as outras tantas que nos passam despercebidas. Talvez não sejam gigantescas porque as vemos como tal ... mas sim por as sentirmos com uma intensidade superior às outras. Por se destacarem perante o ridículo da situação. Ou simplesmente por criarem borboletas no estômago e as outras não serem capazes de o fazer. Eu não tenho sempre a certeza do que quero fazer amanhã, mas sei onde vou estar num tempo futuro e próximo do meu objectivo final. E o não saber hoje o que esperar de um dia que virá a seguir, poderá ser a fonte que precisamos para repor energias e sentir as vibrações na criação de um momento melhor. Não tenho qualquer tipo de problema em dizer que sinto as lágrimas escorrerem-me no rosto sempre que tenho medo de me sentir assim, mas nem assim deixo de ser eu próprio. Acredito na maioria das coisas que as pessoas vêm apenas como fantasias e nas quais todos os dias tentam que eu deixe de acreditar. Não vou ceder tão cedo ao mundo dos comuns mortais, eu gosto do celestial e paradisíaco sabor da ilusão. Gosto de sentir o sonho impulsionar os meus dias e fazer-me crer que acredito em tudo o que vivo .. em tudo o que sinto .. em tudo o que exploro de mim próprio e de alguém. Por razões como estas, deixo-me sempre ficar, deixo-me sempre chorar, gritar, sorrir, crer ... porque todos os dias devem servir para amanhã tentar mais e melhor, mas nem tudo é simples e eficaz.

terça-feira, 6 de novembro de 2012

Timing.

Faço dos meus dias pensamentos e construções do que vivo em mim. Sinto-os com arrogância e exaltação porque não sei se os consigo amarrar ao presente, ao presente de um dia escolhido entre todos os dias de um calendário de emoções. Ao presente representado num futuro próximo de nós. Ao presente onde está recalcado um passado de medos e angústias que eu temo que sejam reproduzidas uma vez mais. É de olhos fechados que relaxo cada músculo do meu corpo, que deixo as emoções soltas por si só, que me perco entre os padrões confusos das esferas aniquiladas por ti. Mas nem os momentos mais calmos são suficientes para eu acreditar no inacreditável. Nem as tentativas que faço serviram para que eu me iludisse e pensasse que agora seria o timing perfeito. Mas a culpa não é só minha. Os medos não surgem de individualidades. Eu não acreditaria que estaria escuro se não tivesse presenciado a escuridão acompanhado por alguém. Porque eu não soletraria o medo, o pavor, a desilusão ... se todas estas palavras fossem de ordem singular e vivessem unicamente no interior de cada um de nós. Se eu acredito que existem, é porque as identifiquei nos outros.

quinta-feira, 11 de outubro de 2012

Pela primeira vez.

Não tenho muitos momentos de clareza sentimental. nem tenho muitos momentos em que perceba o que realmente posso dar. Não faço o género, nunca o fiz. É talvez a distância que mantenho com esse universo, que me impede acima de tudo de ser uma pessoa melhor. Ou de me libertar a uma pessoa melhor. Nunca me hei-de obrigar a ser outro alguém, mas posso sempre modificar-me ou transformar-me. Poderei, eventualmente, ceder-me a um brilho não singular e partilhar o meu íntimo com uma alma que não seja minha. Nos dias de hoje descobri isto: posso ser alguém com o outro. Descobri que posso amar-me sem destituir alguém da responsabilidade de ser amante. Sem privar sentimentos. Sem temer ilusões. Sem fugir do amor. Descobri tudo isto, sem me demitir a mim próprio do meu mundo e sinto-me realizado por ter acontecido assim. É verdadeiro porque não precisei da presença de uma entidade próxima para o sentir. É verdadeiro porque o percebi na solidão de um dia recheado de felicidade. Tornou-se verdadeiro no momento em que o admiti para mim próprio sem medo de o revelar. Tornou-se irrevogável quando o declarei pela primeira vez.

quarta-feira, 27 de junho de 2012

Caminhos de folhas rasgadas.

Vou ser sempre uma dose do que perdi. Aniquilar sempre os pedaços que tenho de ti. E vou ser restos daquilo com que fiquei. Serei impotente, mesmo que esteja presente qualquer coisa que ainda não recordei. Porque de ti não sobra nem resta nada, és caminhos de folhas rasgadas que eu ao sol deixei ficar. Perturbas os espíritos e os montes e quando eu penso para além do presente, recordo-me do que poderia ter continuado sem ti. Recordo-me do que eu era antes de saber o que sou hoje e recordo-me do que eu tinha antes de permitir que me levasses tudo. Desvanecendo o que encontro ao longe, tento voltar a ser algo idêntico a essa imagem. Tento retomar um caminho que eu não tentei sequer decorar, porque nunca pensei que precisasse do retorno. Eu nunca me entreguei a uma realidade da qual tu fazias parte. Eu entreguei-me sempre a uma ilusão de ti. São as ilusões que mais nos doem, quando sabemos que nunca serão realidades nossas. Doem mais porque são expectativas. Doem mais porque são construções mentais do que desejamos para nós mesmos. Eu nunca desejei nada para mim quando o que desejava se tratava de amor. Nunca acreditei que o desejasse, sempre acreditei que não era correcto fazê-lo. E agora, sei que se desejar não o tenho. Sei que se desejar não o sinto. Sei que se desejar não será meu. E não me importo que não seja, tento não me importar que não seja. Se não for, é porque não me pertence, é porque não o mereço, porque também não me merece a mim. Não peço à vida que me devolva o desejado, peço-te a ti que me dirijas uma resposta. Peço-te a ti que não me permitas doer e exijo que o faças rapidamente.

quinta-feira, 7 de junho de 2012

Silêncios nocturnos.

Casa-te comigo em silêncios nocturnos e não me permitas saber razões. Junta-te a um pecado conjugado a dois e deixa-me pensar que as definições são o que eu faço por mim próprio. Eu vou perder o rigor de sentir quando não fizeres desta forma peculiar. Vou largar-me e soltar-me do momento porque não haverá qualquer coisa que eu desconheça de ti e de nós. E o que eu desconheço conduz-me a ficar perto de ti, leva-me a querer descobrir o que não sei. Faz-te recuar quase sempre, faz-te soltar apenas quando estou distraído e quando tu sabes que eu estou. E quando tu sabes que eu não espero de ti. E quando tu sabes que eu acho que não estás a olhar. E quando tu sabes que eu não penso. E quando tu pensas que eu não sinto. É no decorrer de todos eles que tu segues em frente, que tu segues em frente distâncias milimétricas para uns, mas que ambos sabemos que são milhas que tu permites seguir, representando um bocadinho do que futuramente vais deixar-me ter de ti. Nunca deixes que eu conheça tudo, nunca te deixes consumir por mim, nunca deixes que eu deixe que tu o faças. Porque sei que não o vou aproveitar e saborear nessa altura. Nunca vou querer que sejas peças de algo descartável porque perdeste importância ou euforia momentânea. Escolho, e escolherei sempre, a angustia de não saber de ti, ao invés de saber demasiado e não querer saber mais voluntariamente.

segunda-feira, 7 de maio de 2012

Impossíveis que serão sempre Possíveis.

Acho que são as mais tenebrosas aventuras que nos evidenciam e nos distinguem, em consequência do que foi sentido. Pensava-me quase certo, em relação ao que eu poderia retirar de um passado que foi meu e que esperava que se desvanecesse, como qualquer coisa sem importância que foge do alcance de qualquer um de nós. Mas aquilo que nos parece inofensivo, mísero e intacto, pode um dia revelar-se de mau cariz como fruto de um falso repouso temporário. O mais certo é cairmos na realidade, que nos diz que a importância que atribuíamos ao que já foi não será tão ínfima assim. Isto tudo porque, no presente, personificamos e identificamos a pessoa que se apresentava no passado, somos feitos da mesma massa, apenas sofremos alterações momentâneas enaltecendo um outro "eu". Nobilitámos alguém que pretendíamos incorporar, como forma de protecção e a favor da sede pela mudança. Em mim, nunca se tratou de uma ganância fugaz, foi sempre a vontade de querer o conforto merecido, de encontrar o que já se tinha esquecido, de me entregar e pertencer a alguém. Sim, porque os fortes também o desejam. Os valentes também reclamam por coisas impossíveis, coisas impossíveis que serão sempre possíveis até me render e baixar a guarda.

domingo, 1 de abril de 2012

A mim dói-me.

A mim dói-me.
Dói-me o tempo desperdiçado
Dói-me o vivído desesperadamente
Doem-me todos os cigarros fumados
E dói-me tudo por dentro.

Doem-me as dores de ontem, as de hoje e as que virão.
Tempos que sinto que não tenho
Nada do lado do coração.

Não sinto que tenha de sentir,
Coisas que não sou.
Sinto só que me sinto
E que não percebo onde começou.

Não sei quando se foram as cores
Quando perderam o lugar.
Quantas coisas ficaram por dizer
Ou quantas lágrimas por chorar.

Nunca soube aquilo que te disse
Nem mesmo aquilo que a mim me disseste.
Sei só que doeu, ficámos tristes
Sei que depois fui eu, quem ficou com o resto.

Adeus.

Já gastámos as palavras pela rua, meu amor,
e o que nos ficou não chega
para afastar o frio de quatro paredes.
Gastámos tudo menos o silêncio.
Gastámos os olhos com o sal das lágrimas,
gastámos as mãos à força de as apertarmos,
gastámos o relógio e as pedras das esquinas
em esperas inúteis.

Meto as mãos nas algibeiras
e não encontro nada.
Antigamente tínhamos tanto para dar um ao outro!
Era como se todas as coisas fossem minhas:
quanto mais te dava mais tinha para te dar.

Às vezes tu dizias: os teus olhos são peixes verdes!
E eu acreditava!
Acreditava,
porque ao teu lado
todas as coisas eram possíveis.
Mas isso era no tempo dos segredos,
no tempo em que o teu corpo era um aquário,
no tempo em que os teus olhos
eram peixes verdes.
Hoje são apenas os teus olhos.
É pouco, mas é verdade,
uns olhos como todos os outros.

Já gastámos as palavras.
Quando agora digo: meu amor...
já não se passa absolutamente nada.

E, no entanto, antes das palavras gastas,
tenho a certeza
de que todas as coisas estremeciam
só de murmurar o teu nome
no silêncio do meu coração.

Não temos nada que dar.
Dentro de ti
Não há nada que me peça água.
O passado é inútil como um trapo.
E já te disse: as palavras estão gastas.

Adeus.

- Eugénio de Andrade, «Os Amantes Sem Dinheiro», Poesia, Porto

quinta-feira, 29 de março de 2012

Hoje e Amanhã.

Ao teu lado decorrem momentos dos quais não fazes parte. Mas nos quais exerces uma identificação tua. Pedaços de outros que se encaixam em ti, no que já viveste, que te transformam e moldam. Num reviver de tudo aquilo que és feito.
Os laços construídos por alguém, são laços que se soltam ou se amarram, ao mesmo tempo que outro alguém os deixa ir ou os conserva por mais alguns instantes. Tive neste preciso momento, a perfeita noção e a caracterização viva, de que estamos todos juntos num ciclo de amor, ao qual nenhum de nós pertence de uma maneira estável e incondicional. O património que hoje é nosso, já foi de alguém e será património de outrém no futuro.
Simplesmente acontece. Inevitávelmente. Como mudam as estações e se modificam vidas. Desde que te permitas viver, serás uma vítima constante de um 'carrossel' de relações e vivências que permitem crescimento, num envolvimento que não é sólido mas que faz parte do que és. Sempre que o compasso se mantenha, seremos nós e outros. Seremos Hoje e Amanhã. Seremos plural e singular, sempre que nos deixarem ser.

domingo, 25 de março de 2012

Ilusão imparcial.

Grandes respostas nunca nos serão entregues vindas do mundo por nós partilhado. Respostas do género, provém de algo intimamente profundo que encontraremos sempre numa sintonia singular. Respostas que serão próprias e que por mais que queiramos os outros nunca serão capazes de nos dar. Por isso desisto de as encontrar em alguém. Centrar-me-ei em mim. Irei focar-me em tudo o que penso que pode ajudar-me a compreender aquilo que quero. Até porque tenho uma ilusão imparcial do que desejo obter do mundo. Ilusão essa que se vai esbatendo sempre que me esqueço que os outros existem. Sempre que grito pela minha singularidade. Sempre que ignoro o que querem de mim, quando o que querem não me satisfaz.

terça-feira, 20 de março de 2012

Que eu quero ver nascer.

Peço-te que aqueças os meus espaços. Funde-te em perfeição. Deixa apenas o que já foi.
Arrefece pensamentos. Abranda os festejos. Deixa apenas o que já foi.
Melhora o que está presente. Encontra-me e domina-me. Assegura-me em liberdade. Deixa o que já foi, onde o que já foi ficou.
Permanece o espírito destrutivo, prevalecendo novas realidades que eu vou deixando caracterizarem este espaço, que pretendo não ser apenas para mim. Não o quero preencher sobre uma solidão volumosa, sobre temperamentos passados, sobre olhares ofegantes do medo de algo que eu já vi. Quero roubá-lo ao tempo indeterminado, onde os dias não são memórias e onde posso constituir o inesperado, de uma personagem que nunca interpretei. Quero levá-lo até ao teu "timing", ser parte integrante do teu protagonismo e revelar-me perante ti. Mostrar-me despido de tudo e espelhar-me na tua reacção. Apenas quero participar em constantes evidências de uma felicidade una, que eu quero ver nascer.

O quanto me posso dar.

Agrada-me o tempo imperfeito em que não conheço os finais das histórias. Gosto particularmente da forma insólita como conduzo as narrativas que me permitirão alcançar um fim. É verdade que as escrevi como um hábito obessivo numa procura exaustiva de algo que não existia. E eu sabia da não-existência. Soube sempre que seriam idealizações em demasia. Apercebi-me, inicialmente, qual seria a minha condenação. Agora está decidido. Fui forçado a desistir de procurar o melhor de mim em alguém. Alguém exterior a mim. Condenaram-me a permitir-me olhar o meu reflexo e perceber o quão suficiente sou. O quanto me posso dar. O quanto tenho em mim.

sexta-feira, 16 de março de 2012

Passos em falso.

É arrepiante a forma compulsiva com que consomes parte do que é meu. E às vezes eu não sei. Às vezes eu finjo não saber. Às vezes tento não sentir. E acabo por ceder em ti. Soltar qualquer acto que te mantenha perto. Fazer de ti submisso obsessivo sem nada a perder. Digo-te como deveriam ser as coisas, mas na realidade não sei dizer. Improviso. Permito-te pensar que o meu pragmatismo é real. Deixo-te acreditar que consigo controlar-me quando algo arruinar o momento. Mas, na verdade, eu próprio não ficaria satisfeito. Nem mesmo se soubesse que conseguiria, de alguma forma, reconstruí-lo. Não vou estudando a pessoa que és. Pelo menos conscientemente e de uma maneira calculista. Eu tambem dou passos em falso. Eu tambem corro riscos. Eu tambem poderei "cair".

segunda-feira, 5 de março de 2012

O sabor não tem sabor.

Eu sei que sabes o que sou agora. Sei que sabes os motivos e o que me fez mudar. Sei que sabes os porquês e as dores causadas ridículamente. Eu tambem sei aquilo que és. Sei disso antes de saber o que queria que fosses agora e o que queria que tivesses sido. O que eu me poderia tornar contigo ou o que faria se não pudesse. Transformaria qualquer coisa que impedisse uma ligação a ti.
O sabor não tem sabor se não o partilhar com os teus lábios. E eu sei que gosto de partilhar contigo, sei que gosto que sejas tu, mesmo sem ter algo que me dê certezas disso. Mesmo sem ter alguém que me diga que experimentei. Mesmo sem confirmar que os meus lábios encaixam nos teus, que podes ser parte do meu todo, que tens algo que me pertence a mim.

terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

Estimulador.

Eu às vezes não sei o que posso ou o que devo fazer com o que tenho em mãos. Às vezes não sei se pode ser um motivo de crescimento e progresso ou uma dissolução de mim. Sinto-me entre o desprotegido perante um potencial estimulador, ou sinto-me potencialmente fortalecido sem nada a incentivar-me, apenas com a ideia que algo o pode fazer. São as percepções que se instalam dos momentos em que fico, irrevogavelmente, na dúvida entre o fazer e o querer. Entre o ausente e o adquirido. Entre o que é meu agora e o que pode ser meu depois.

domingo, 5 de fevereiro de 2012

No name.

É impossível que sejas o limite de um caminho não percorrido. É intorável que na minha cabeça exista o vazio de coisas ínfimas que outrora foram suficientes para chegar a ti. E agora não estou a ser capaz.
É anormal quando agora sei que nada é, nada foi e nada será meu quando o propósito és tu. Se te agarrares à falácia do "nada é impossível", não terás a certeza, por mais vontade que tenhas, de estar a acreditar em algo que devas acreditar. Eu não acredito. Não porque não deva, não porque não posso, só porque não quero. Porque não me vou permitir fazê-lo.
Tenho consciente a ideia de que todas as minhas capacidades se tornam limitadas a determinada altura. São competências que se desenvolvem em contextos particulares e dependentes das nossas relações. Eu posso perguntar-me. Consigo distanciar-me de mim e de ti e colocar esta realidade em causa. Quando fiz o tal exercicio, acabei por vencer em todos os pontos. Terminei sem hipóteses de seres qualquer uma das coisas que eu tinha registado.

segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

Nada nosso.

Sim, acende-me um cigarro. Acende-me um cigarro e partilha-o comigo. Partilha comigo o cigarro e a vontade tambem.
Sim, encosta-te a mim. Ou não te encostes se não quiseres. Se te encostasses estarias apoiado. Apoiado por um tempo indeterminado. Acenderíamos inúmeros cigarros. Encostar-nos-íamos infinitas vezes. Mas nunca seriamos um. Gosto que sejamos singulares. Singulares que partilham algo. Algo que não sendo partilhado não é mais que uma convulsão solitária. Solitário por ser teu e meu. E nada nosso.

quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

Eu careço e tu tambem.

Expulsa-me de onde me deixaste. Leva-me para um lugar melhor. Leva-me para onde não haja vozes. Leva-me para onde não existam ruídos. Leva-me para espaços despegados de mim, para onde a minha identidade se confunda, para onde os sentidos sejam palpáveis, para onde estejas a habitar.
Trazer-me mais do que aquilo que trouxeste até agora não seria um acto solidário, seria um desafeiçoar das tuas fobias, um dissimular das contradições. Seria desligares-te da faceta oculta que trazes contigo e que realças sempre que me aproximo do teu inconsciente. Eu careço disso. Careço da tua coragem para me incitar o espírito. Careço de horas de felicidade numa imensidão de espaços que pretendo que sejam meus. Eu careço e tu tambem. Não dispensas pensamentos, ideias feitas e conclusões. Não dispensas as hipóteses voláteis susceptíveis de destruição. Não prescindes das sombras que não te permitem ir avante. Não dispensas o agora e é por isso que careces.