quarta-feira, 24 de julho de 2013

mais impossível do que a vida.

'Se te aprendessem as minhas mãos, forma do vento a cevada pura, de ti viriam cheias as minhas mãos sem nada. Se uma vida dormisses na minha espuma, que frescura indecisa ficaria no meu sorriso? No entanto és tu que te moverás na matéria da minha boca, e serás uma árvore a dormir e a acordar onde existe o meu sangue. Beijar os teus olhos será morrer pela esperança. Ver no aro de fogo de uma entrega a tua carne de vinho roçada pelo espírito de Deus, será criar-te para luz dos meus pulsos e instante do meu perpétuo instante. Eu devo rasgar a minha face para que a tua se encha de um minuto sobrenatural, devo murmurar cada coisa do mundo até que sejas o incêndio da minha voz. As águas que um dia nasceram onde marcaste o peso jovem da carne, aspiram longamente a nossa vida. As sombras que rodeiam o êxtase, os bichos que levam ao fim do instinto o seu bárbaro fulgor, o rosto divino impresso no lodo, a casa morta, a montanha inspirada, o mar, os centauros do crepúsculo - aspiram longamente a nossa vida. Por isso é que estamos a morrer na boca um do outro. Por isso é que nos desfazemos no arco do verão, no pensamento da brisa, no sorriso deserto, no peixe, no cubo, no linho, no mosto - no amor mais impossível do que a vida.' - Helder. H.

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